É possível aplicar o arrependimento posterior aos crimes culposos? E no homicídio culposo?
O arrependimento posterior está previsto no artigo 16 do Código Penal: “Nos crimescometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).”
Sendo assim, os requisitos para que o agente possa ter a diminuição de 1/3 a 2/3 são os seguintes:
a) Crimes sem violência ou grave ameaça
b) Reparação do dano ou restituição da coisa.
c) Até o recebimento da denuncia ou queixa
Neste post, vamos trabalhar apenas com o primeiro requisito, a partir do seguinte questionamento: Qualquer violência própria, imprópria, dolosa ou culposa impede o arrependimento posterior?
NÃO. Em caso de violência culposa, é cabível o arrependimento posterior. Isso porque, não houve violência na conduta, mas sim no resultado.
Imaginemos o exemplo da lesão corporal culposa – crime de ação penal pública condicionada em que a reparação do dano pode, inclusive, acarretar na renúncia ao direito de representação se celebrada a composição civil, na forma do art. 74 e parágrafo único da Lei 9.099/1995. Neste caso, é possível também o arrependimento posterior.
Quanto à violência imprópria, há divergência doutrinária.
Para a primeira corrente, a violência imprópria permite o arrependimento posterior, pois se o legislador quisesse impedir, teria expressado a violência imprópria, tal qual o fez no artigo 157 do Código Penal (“ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência”)
Lado outro, para a segunda corrente, a violência imprópria impede o arrependimento posterior, na medida em que o dolo persiste de tal forma que tal comportamento aumenta a pena do sujeito, uma vez que converte o crime de furto em roubo.
Como se vê, embora exista divergência na doutrina quanto à violência imprópria, há entendimento da possibilidade de aplicação do arrependimento posterior em crimes com violência culposa.
Daí, surge outra questão: É possível aplicar o arrependimento posterior diante do homicídio culposo?
Imagino que você seja tentado a dizer ser possível. Todavia, é necessário atentar para o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Vamos conferir:
REsp 1.561.276-BA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 28/6/2016, DJe 15/9/2016 (Informativo n. 590). RECURSO ESPECIAL. PENAL. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ART. 312 DO CTB. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA. ARREPENDIMENTO POSTERIOR. ART. 16 DO CP. REPARAÇÃO DO DANO. APLICÁVEL APENAS NOS CRIMES PATRIMONIAIS. PLEITO SUBSIDIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATENUANTE. ART. 65, III, B, DO CP. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO. SÚMULA 231/STJ.
O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que, para que seja possível aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 16 do Código Penal, faz-se necessário que o crime praticado seja patrimonial ou possua efeitos patrimoniais.
As Turmas especializadas em matéria criminal do Superior Tribunal de Justiça firmaram a impossibilidade material do reconhecimento de arrependimento posterior nos crimes não patrimoniais ou que não possuam efeitos patrimoniais.
In casu, a composição pecuniária da autora do homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302 do CTB) com a família da vítima, por consectário lógico, não poderá surtir proveito para a própria vítima, morta em decorrência da inobservância do dever de cuidado da recorrente.
A partir do julgado, podemos extrair as seguintes conclusões:
1. O arrependimento posterior só alcança crimes patrimoniais ou de efeitos patrimoniais;
2. Impossibilidade de aplicação em homicídio culposo, ainda que ocorra composição civil entre o autor do fato e a família da vítima, pois tal acordo não implica em reparação do dano (a vida ceifada não pode ser restituída).
Logo, embora seja plenamente possível a aplicabilidade do arrependimento posterior aos crimes culposos, não é possível tal diminuição de pena ocorrer no homicídio culposo, ainda que ocorra composição civil entre o autor do fato e a família da vítima.