O pagamento da fatura de energia elétrica antes do recebimento da denúncia extingue a punibilidade do crime de furto?
No caso de furto de energia elétrica mediante fraude, o adimplemento do débito antes do recebimento da denúncia não extingue a punibilidade.
Nos crimes contra a ordem tributária, é possível falar em extinção da punibilidade quando ocorre o pagamento do débito antes do recebimento da denúncia (Leis nº 9.249/1995 e nº 10.684/2003). Isso porque, o Estado tem maior interesse em garantir a higidez do patrimônio público. Decerto, o Direito Penal é instrumentalizado como forma de efetivar o cumprimento da obrigação fiscal (função preventiva geral negativa).
Tal raciocínio pode ser aplicado ao crime de furto? O pagamento da fatura de energia elétrica antes do recebimento da denúncia extingue a punibilidade do crime de furto?
OLHA SÓ! O furto de energia elétrica não pode receber o mesmo tratamento dado ao inadimplemento tributário.
Ora, a jurisprudência afirma que a natureza jurídica da remuneração pela prestação de serviço público (energia elétrica), prestado por concessionária, é de tarifa ou preço público. Logo, não possui caráter tributário. Assim, não há como se atribuir o efeito pretendido aos diversos institutos legais, uma vez que o art. 34 da Lei nº 9.249/1995 e o art. 9º da Lei nº 10.684/2003 fazem referência expressa e taxativa aos tributos e contribuições sociais. Portanto, não são aplicáveis às tarifas ou preços públicos.
Assim, qual a consequência do pagamento da fatura de energia elétrica antes do recebimento da denúncia no crime de furto?
Caracteriza arrependimento posterior, pois presentes os requisitos: a) Crime sem grave ameaça ou violência; b) restituição da coisa ou pagamento do dano; c) antes do recebimento da denúncia e c) por ato voluntário. Como consequência, haverá diminuição da pena de um a dois terços. (art. 16 do CP).
Como se vê:
- O pagamento da fatura de energia não gera a extinção da punibilidade no crime de furto…
- uma vez que não se aplica aos crimes patrimoniais o mesmo raciocínios dos crimes tributários…
- ainda que envolva concessionária de serviço público, pois tal pagamento não possui natureza tributária, mas tarifa ou preço público, mas…
- em caso de condenação, o agente fará jus à diminuição da pena, em razão do arrependimento posterior.
O entendimento acima foi firmado pelo Superior Tribunal de Justiça – 3ª Seção. RHC 101.299-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Rel. Acd. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 13/03/2019 (Info 645)
O assunto já foi objeto de questionamento na prova para Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Ceará. Confira:
Joaquim, com o intuito de fornecer energia elétrica a seu pequeno ponto comercial situado em via pública, efetuou uma ligação clandestina no poste de energia elétrica próximo a seu estabelecimento. Durante dois anos, ele utilizou a energia elétrica dessa fonte, sem qualquer registro ou pagamento do real consumo. Em fiscalização, foi constatada a prática de crime, e, antes do recebimento da denúncia, Joaquim quitou o valor da dívida apurado pela companhia de energia elétrica.
Consoante a jurisprudência do STJ, nessa situação hipotética, Joaquim praticou o crime de
A) furto mediante fraude, cuja punibilidade foi extinta com o pagamento do débito antes do oferecimento da denúncia.
B) estelionato, cuja punibilidade foi extinta com o pagamento do débito antes do oferecimento da denúncia.
C) furto simples, cuja punibilidade não foi extinta com o pagamento do débito, apesar de essa circunstância poder caracterizar arrependimento posterior.
D) estelionato, cuja punibilidade não foi extinta com o pagamento do débito, apesar de essa circunstância poder caracterizar arrependimento posterior.
E) furto mediante fraude, cuja punibilidade não foi extinta com o pagamento do débito, apesar de essa circunstância poder caracterizar arrependimento posterior.
GABARITO: E