A APLICABILIDADE DO MONITORAMENTO ELETRÔNICO
Eduardo Augusto da Silva Dias. Helom César da Silva Nunes.
Por que não monitorar eletronicamente presos de regime fechado e provisórios?
A Lei 12.258 de 2010 que permite o monitoramento eletrônico traz reflexos imediatos na custódia cautelar dos presos que cumprem pena em regime semiaberto ou estão em prisão domiciliar.
Como regra geral, a apenado do regime semiaberto tem direito à saída temporária e realização de trabalho externo, sem vigilância.
Do mesmo modo, a prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial, cujas hipóteses estão dispostas no art. 318 do Código de Processo Penal, sendo atingidas pessoas maiores de 80(oitenta) anos, pessoas extremamente debilitadas por motivo de doença grave, gestante a partir do sétimo mês de gravidez ou sendo esta de alto risco, além de alcançar pessoas que tenham sob cuidado menor de 6(seis) anos de idade ou com deficiência.
Neste sentido, temos uma primeira constatação: o monitoramento não ajuda a reduzir a superlotação carcerária, pois constitui um acréscimo na fiscalização do custodiado.
Observa-se com isso, que o desiderado da execução penal peca no processo de reintegração social, já que o monitoramento eletrônico de quem está em prisão domiciliar e em regime semiaberto sinaliza que o Estado não confia no preso.
Não se pode olvidar que o:regime semiaberto é a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. O regime semiaberto se cumpre em estabelecimentos de segurança média, nos quais as precauções contra a fuga são atenuadas. Podem os presos ser colocados em alojamentos coletivos (art. 91, da LEP).
Há previsão da realização de exame criminológico de classificação e individualização. O trabalho, interno ou externo, bem como a frequência a cursos profissionalizantes também compõem as regras gerais deste regime intermediário (art. 35, e §§, do CP). (SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro : Elsevier, 2011, p.340)
Logo, no regime prisional semiaberto, o processo de reintegração social está atrelado justamente na possibilidade de em alguns períodos o preso ter o contato com o mundo exterior sem a vigilância estatal, de modo que demonstre sua capacidade de reintegrar-se e conduzir-se para alcançar a plena liberdade.
Já na prisão domiciliar, o monitoramento eletrônico mostra-se inócuo, pois aquela está adstrita a pessoas que não possuem condições físicas e psicológicas de suportarem uma restrição maior em sua liberdades e por isso merecem cuidados maiores a sua saúde.
Neste contexto, a prisão domiciliar não vem de imediato para proporcionar segurança pública contra cidadão contumaz na prática delitiva, mas a partir do princípio da dignidade da pessoa humana, colocar primeiro a vida e a saúde do preso distantes do risco do cárcere, ao passo que seus domicílios constituem local ideal, não para o cumprimento de pena e sim como espaço destinado para preservar direitos fundamentais e que propiciem acesso a condições dignas ao lado de seus familiares.
Por outro lado, se a intenção dos operadores do direito for pela readequação dos presídios e evitar superlotações, o monitoramento eletrônico deve mudar o alvo de suas atenções para quem está no regime fechado ou em prisão provisória.
Se a tecnologia permite acompanhar em tempo real a localização de pessoas, por que não pensar em utilizar o monitoramento para aqueles que realmente necessitam de fiscalização imediata e por isso estão em regime mais severo?
Ora, a fiscalização do preso em domicílio, monitorado eletrônicamente, terá o mesmo efeito quando em regime fechado, diante de que seus passos estão, em tempo real, sendo acompanhados pelo sistema de segurança pública. Antes da Lei 12258/10, a prisão domiciliar realmente se mostrava incompatível para quem estava em regime fechado justamente pela dificuldade de fiscalização, o que não ocorre após a possibilidade de monitoramento eletrônico.
Nessa linha, por que não utilizar o monitoramento para condenados do regime fechado e presos provisórios?
É bem verdade que a lei 12258/10 náo alcança condenados do regime fechado ou presos provisórios fora das hipóteses do art. 318 do CPP. No entanto, não se pode olvidar que Lei e Direito não se confundem, existindo outros meios de interpretação alheios à literal como forma de efetivar o princípio da dignidade da pessoa humana e proporcionalidade.
Nesta seara, a aplicação da monitoramento eletrônico deve ser uilizada como uma alternativa ao cárcere e não como incremento de um sistema falido.
À luz da proporcionalidade deve o operador do direito verificar a necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito quando em jogo a liberdade.
Se há outro meio menos rigoroso como alternativa ao cárcere e que preservem tanto a custódia cautelar assim como a dignidade humana, o monitoramento eletrônico é ferramenta que não deve passar ao largo dos condenados em regime fechado ou presos provisórios.
Monitoração eletrônica – espécie de medida cautelar ou “letra morta”?
Embora já regulamentada no ordenamento jurídico desde a Lei n. 12.258/10 para fins de aplicação da Lei de Execução Penal, a monitoração eletrônica ganhou espaço na persecução penal com edição da Lei n. 12.403/11.
Prevista no artigo 319, IX, do Código de Processo Penal, a ferramenta tecnológica teve sua utilidade reconhecida na fase inquisitiva e no decorrer do processo. Nada mais coerente. Como poderia determinado instrumento menos aflitivo ser usado para aquele já condenado e deixar pessoas que ainda são constitucionalmente inocentes em situação de maior constrangimento?
Dessa forma, as leis n. 12.258/10 e 12.403/11 autorizam a monitoração eletrônica em dois momentos:
a) Na execução penal: Saídas temporárias e prisão domiciliar (Art. 146-B da LEP)
b) Na investigação e processo: Medida cautelar, substitutiva da prisão (art. 319, IX, do CPP).
Decerto, a ferramenta eletrônica poderia ser uma forte aliada para condução do processo e cumprimento digno da pena,
Como se vê, o instrumento em tela coopera para manter o indivíduo em local determinado, impede-o de frequentar locais previstos na decisão judicial motivada, bem como possibilita conhecimento ao Estado da rotina do agente no período em que está submetido à medida.
Mas… se houver violação ou remoção do dispositivo? O art. 146-C é plenamente aplicável. Assim, poderá haver imposição de outra medida cautelar mais aflitiva, sem prejuízo até mesmo da prisão preventiva, isto é, a custódia cautelar será a ultima ratio da ultima ratio.
Como se vê, a monitoração eletrônica é uma valiosa medida cautelar.
Malgrado, a autorização legal para uso do monitoramento eletrônico desde o ano de 2010, até hoje, o Estado do Amazonas não oferece a importante ferramenta para que seu uso seja determinado nas decisões judiciais. Desse modo, o débito vai para conta do réu e de toda a sociedade. O acusado fica desprovido de se submeter a uma medida menos aflitiva que a prisão (lembrando que no caso do art. 319, IX, do CPP ainda não há sequer condenação). Por sua vez, a sociedade não consegue controlar de forma eficiente a observância das restrições impostas na decisão judicial, nem evitar eventual reiteração de conduta delitiva.
Diante disso, lamentavelmente, a monitoração eletrônica permanece como letra morta, por absoluta ausência na prática.