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O sigilo do inquérito policial

No direito brasileiro, a publicidade é a regra a ser adotada nos atos processuais. Vejamos o que diz a Constituição da República sobre o tema:

“Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado” CF – art. 5.º, XXXIII.

“A lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem” CF – art. 5.º, LX:

Portanto, em regra, deverá ser sempre assegurada a publicidade dos atos em geral.

Todavia, o artigo 20 do Código de Processo Penal dispõe: “A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade”.

Malgrado a única norma transcrita que trata do inquérito seja a constante do art. 20 do CPP, o raciocínio que se faz é: se para o processo a regra é a publicidade, então para o inquérito esta também deve ser a regra.

No entanto, a publicidade pode ser restringida, e daí passa-se a falar em sigilo. Isso não viola a Conveção Americana de Direitos Humanos. Confira:

Art. 8.º, 5: “O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça”.

O sigilo nada mais é do que a restrição da publicidade. Pode haver três tipos de sigilo:

A) SIGILO EXTERNO – consiste na limitação da informação para o público externo, para a sociedade em geral. O art. 20 do CPP tem por destinatário o público em geral. Vale dizer: o art. 20 cuida do sigilo externo, limitando o acesso da sociedade em geral aos atos da investigação.

B) SIGILO INTERNO – consiste na limitação da informação a determinado sujeito da investigação. Normalmente a publicidade é limitada ao investigado.

Em regra, não poderá haver limitação do acesso das partes aos atos da investigação. Isto vem garantido pelas regras acima apresentadas e, também, pelo disposto no Estatuto da OAB, que assegura o direito de acesso aos autos ao advogado conforme se vê do art. 7.º, XIII, XIV, XV, XVI e XXI § 1.º (Estatuto da OAB, Lei 8.906/1994).

C) SIGILO ABSOLUTO – No entanto, há situações em que o sigilo deve incidir. Estas situações referem-se normalmente à figura do advogado e de seu defensor, seja constituído, dativo ou mesmo defensor público. São situações ligadas à natureza da medida tomada ou então à própria cautelaridade do ato a justificar que se restrinja o acesso de uma das partes aos atos de investigação sob pena de perda de sua eficácia.

Imaginemos o exemplo da interceptação telefônica em andamento. É evidente que não pode ser permitido o acesso do investigado à medida. Vale dizer, não pode o investigado saber da existência da interceptação telefônica sob pena de

simplesmente ela perder a eficácia, na medida em que ninguém, em sã consciência, usaria um telefone sabendo que ele está grampeado.

Da mesma forma, quando se defere busca e apreensão na residência do investigado. Não se pode permitir que ele saiba que os policiais irão até sua residência sob pena de o acusado destruir todas as provas e fontes de prova que seriam encontradas com a medida.

Nesse sentido, o artigo 7º, §11, da Lei n. 8906/94 – § 11.  No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências.  

NÃO ESQUEÇA! A restrição ao sigilo interno e aplicação do sigilo absoluto é medida excepcional. Tanto assim que fora editada a Súmula Vinculante 14 pelo STF com o seguinte teor: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.

Esta súmula deve ser entendida de maneira ampla, de forma que podemos extrair algumas regras:

a) a regra é que o sigilo interno não alcance o defensor

b) o defensor poderá ter acesso amplo aos elementos de prova que afetem os interesses do representado

c) este acesso é garantido unicamente aos elementos de prova já documentados.

Como se vê, o sigilo do inquérito policial mitiga a regra constitucional da publicidade, mas isso ocorre no interesse público, sem que prejudique o acesso do investigado, observada as diligências específicas em andamento que não podem ser frustradas.

Caso  haja cerceamento e negativa de acesso ao inquérito policial?

Três medidas poderão ser adotadas pelo Advogado/Defensor Público:

a) RECLAMAÇÃO ao Supremo Tribunal Federal – A reclamação consiste em manifestação do direito de petição e deve ser feita diretamente ao STF, podendo haver pedido de liminar.

b) MANDADO DE SEGURANÇA – O mandado de segurança poderá ser impetrado diretamente ao juiz criminal para assegurar o acesso aos autos do inquérito policial.

c) HABEAS CORPUS – Claro que a possibilidade de utilização do HC unicamente com o fito de ter acesso aos autos do inquérito policial é controversa. No entanto, a jurisprudência do STF aceita o HC quando a pretensão está acompanhada de pedidos típicos de HC (temas relativos à prisão e liberdade, por exemplo).

CURIOSIDADE! No caso da Lei n. 12850, o juiz poderá determinar o sigilo das investigações quando envolver organizações criminosas, ocasião em que o acesso por parte do advogado dependerá de prévia autorização judicial. Este é o teor do artigo 23: O sigilo da investigação poderá ser decretado pela autoridade judicial competente, para garantia da celeridade e da eficácia das diligências investigatórias, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, DEVIDAMENTE PRECEDIDO DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL, ressalvados os referentes às diligências em andamento.

Categorias:Processo Penal
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