O Princípio da insignificância e os crimes do Estatuto do Desarmamento
Para começo de conversa, lembremos que o princípio da insignificância qualifica-se, como fator de descaracterização material da tipicidade penal. O princípio da insignificância – que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal – tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material.(STF- RHC 122.464/BA).
Segundo os tribunais superiores, o princípio da insignificância pode ser aplicado em qualquer crime, desde que seja com ele compatível. Assim, devem ser observados os seguintes requisitos: O valor do objeto do crime e os aspectos objetivos do fato, tais como,a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada. (STF, RHC 118.972/MG).
Superadas as linhas iniciais. Vamos dialogar sobre a aplicabilidade da bagatela nos crimes de posse e porte de arma.
Desta feita, os tribunais superiores consideram os crimes de posse e porte de arma como perigo abstrato.
O QUE SIGNIFICA SER CRIME DE PERIGO ABSTRATO (PRESUMIDO, OU DE SIMPLES DESOBEDIÊNCIA)? Significa que tal crime se consuma com a prática da conduta, não se exigindo a comprovação da produção da situação de perigo, pois, ao contrário, há presunção absoluta (iuris et de iure) de que determinadas condutas acarretam perigo a bens jurídicos.
No entanto, nos últimos anos, percebe-se que STF e STJ também tem aceitado o princípio da insignificância em crimes relacionados ao desarmamento. Porém, isso só ocorre quando as munições são encontradas sem arma.
Assim, se uma pessoa possui apenas uma pequena quantidade de munição, desacompanhada de arma de fogo, a sua conduta torna-se irrelevante para o mundo jurídico, pois não representa nenhuma expectativa de perigo de dano à incolumidade pública.
Neste sentido, entre outros casos, julgaram o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça:
1. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO. AUSÊNCIA DE ARMA DE FOGO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. POSSIBILIDADE. 1. O Supremo Tribunal Federal passou a admitir, excepcionalmente, a aplicação do princípio da insignificância quando apreendidas pequenas quantidades de munições desacompanhadas da arma de fogo, por falta de potencial lesivo concreto. Precedentes. 2. Na espécie, o acusado foi surpreendido em sua residência na posse de munição de uso permitido – 1 cartucho, calibre 22. Desse modo, considerando a quantidade não relevante de munições, bem como a ausência de qualquer arma de fogo, deve ser afastada a tipicidade material do comportamento. Precedentes.3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 1213616/MG, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/09/2018, DJe 25/09/2018)
2. PENAL E PROCESSO PENAL. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DE RECURSO. NÃO CABIMENTO. POSSE DE MUNIÇÕES. AUSÊNCIA DE ARMA. IRRELEVÂNCIA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. POSSIBILIDADE. PEQUENA QUANTIDADE DE MUNIÇÃO. AUSÊNCIA DE ARTEFATO. PRECEDENTES DO STF E DO STJ. ENTENDIMENTO QUE NÃO PODE LEVAR À PROTEÇÃO DEFICIENTE. NECESSIDADE DE ANÁLISE DO CASO CONCRETO. POSSE DE 2 MUNIÇÕES DESACOMPANHADAS DE ARMA. INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO, PARA ABSOLVER O PACIENTE. (HC 446.915/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 15/08/2018)
3. É atípica a conduta daquele que porta, na forma de pingente, munição desacompanhada de arma. STF. 2ª Turma. HC 133984/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 17/5/2016 (Info 826).
4. A posse da munição (uma bala calibre 9mm e outra calibre 7.65mm) desacompanhada de uma arma de fogo, por si só, não é capaz de caracterizar o delito previsto no estatuto. Pequena apreensão de munições sem arma de fogo não resta configurada a tipicidade material do delito (STJ – Resp 1710320; STF n. RHC143.449/MS).
5. Posse de munição é crime de perigo abstrato, mas se a munição é de festim, não há perigo real. Posse de munição de uso restrito (art. 16) desacompanhada de arma de fogo compatível com a sua utilização (fuzil). Constatação pericial de que referida munição constituía simples festim (STF n. 149.450)
SE LIGA! Os julgados reconhecem o princípio da insignificância (por ausência de lesividade à incolumidade pública), quando a munição apreendida, seja de uso permitido ou restrito, encontra-se em pequena quantidade e desacompanhada de armamento apto a deflagrá-la.