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O “estelionato previdenciário” é crime permanente, continuado ou instantâneo de efeitos permanentes?  Qual o termo inicial da prescrição?

O estelionato previdenciário ocorre quando a obtenção da vantagem mediante fraude gera prejuízo a entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

Na verdade, o estelionato previdenciário não é um crime autônomo, mas é o próprio crime de estelionato previsto no artigo 171, com incidência da causa de aumento de 1/3 (um terço), prevista no parágrafo 3º, do Código Penal.

A questão a ser enfrentada é a seguinte: O “estelionato previdenciário” é crime permanente, continuado ou instantâneo de efeitos permanentes?

Saber disso é fundamental para sabermos o termo inicial da contagem do lapso prescricional (art. 111, I, do CP).

Todavia, para chegarmos a reposta, precisamos compreender que o estelionato previdenciário pode ocorrer em situações diversas:

SITUAÇÃO 1 – A fraude ocorre na origem, ou seja, o benefício é criado com ardil, sem qualquer atendimento aos requisitos legais. O agente (beneficiário), falsifica documentos para obter uma aposentadoria por invalidez.

SITUAÇÃO 2 – O benefício foi alcançado observando os requisitos legais. No entanto, após a morte do legítimo beneficiário, um terceiro (geralmente, familiar) continua a receber os valores, sem que o instituto de previdência não seja informado.

SITUAÇÃO 3 – Alguém pratica a fraude em favor do beneficiário (ex.: Um funcionário do INSS “cria” o benefício em favor de alguém que não tem direito ao benefício.

Na SITUAÇÃO 1 – O crime é permanente, pois a obtenção da vantagem é produto de reiteração de condutas baseada no ato fraudulento cometido pelo próprio agente. Neste sentido, confira os entendimentos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça:

“O crime de estelionato previdenciário, quando praticado pelo próprio favorecido pelas prestações, tem caráter permanente, cessando a atividade delitiva apenas com o fim de sua percepção, termo a quo do prazo prescricional. Precedentes” (STF – HC 121.390/MG, 1ª Turma, j. 24/02/2015).

“A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o crime de estelionato previdenciário de valores sujeitos à Administração Militar, quando praticado pelo próprio beneficiário das prestações, tem caráter permanente, o que fixa como termo inicial do prazo prescricional a data da cessão da permanência, devendo ser configurada, na espécie, como termo inicial para a contagem da prescrição, a data em que foi percebida a última parcela do benefício. Precedentes” (STF – HC 115.975/BA, 2ª Turma, j. 05/11/2013).

“O estelionato previdenciário configura crime permanente quando o sujeito ativo do delito também é o próprio beneficiário, pois o benefício lhe é entregue mensalmente (Precedentes)” (STJ – AgRg no AgRg no AREsp 992.285/RJ, 5ª Turma, j. 20/06/2017).

“A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Resp nº 1.206.105/RJ, afetado à sua competência, firmou compreensão no sentido de que, quando praticado pelo próprio beneficiário, o estelionato efetivado em detrimento de entidade de direito público é crime permanente, uma vez que a ofensa ao bem jurídico tutelado é reiterada, mês a mês, enquanto não há a descoberta da fraude, de modo que o termo inicial do prazo prescricional, em casos tais, dá-se com o último recebimento indevido da remuneração” (STJ – AgRg no REsp 1.571.511/RS, 6ª Turma, j. 18/02/2016).

NA SITUAÇÃO 02, o crime é continuado.  O agente continua recebendo o benefício que, devido legitimamente na origem, mas que deveria ter cessado em virtude da morte do beneficiário. Em virtude das mesmas circunstâncias de tempo, local e modo de execução, considera-se como se uma obtenção de vantagem fosse continuação de outra (art. 71 do CP). Confira a jurisprudência:

“O delito de estelionato, praticado contra a Previdência Social, mediante a realização de saques depositados em favor de beneficiário já falecido, consuma-se a cada levantamento do benefício, caracterizando-se, assim, continuidade delitiva, nos termos do art. 71 do Código Penal, devendo, portanto, o prazo prescricional iniciar-se com a cessação do recebimento do benefício previdenciário. Precedentes” (AgRg no REsp 1.378.323/PR, 6ª Turma, j. 26/08/2014).

“1. Tem aplicação a regra da continuidade delitiva ao estelionato previdenciário praticado por terceiro, que após a morte do beneficiário segue recebendo o benefício antes regularmente concedido ao segurado, como se ele fosse, sacando a prestação previdenciária por meio de cartão magnético todos os meses. 2. Diversamente do que ocorre nas hipóteses de inserção única de dados fraudulentos seguida de plúrimos recebimentos, em crime único, na hipótese dos autos não há falar em conduta única, mas sim em conduta reiterada pela prática de fraude mensal, com respectiva obtenção de vantagem ilícita. 3. Recurso desprovido” (REsp 1.282.118/RS, 6ª Turma, j. 26/02/2013).

NA SITUAÇAÕ 03, o crime será Instantâneo de efeitos permanentes, pois a conduta fraudulenta foi praticada em favor de terceiro que recebe o benefício indevido. Neste caso, o agente comete apenas uma conduta, da qual outra pessoa se beneficia reiteradamente (razão dos efeitos permanentes):

“Tratando-se de crime de estelionato previdenciário praticado para que terceira pessoa possa se beneficiar indevidamente tem natureza de crime instantâneo com efeitos permanentes, devendo ser contado o prazo prescricional a partir do recebimento da primeira prestação do benefício indevido” (STJ – RHC 66.487/PB, 6ª Turma, j. 17/03/2016).

“O estelionato previdenciário é crime instantâneo de efeitos permanentes quando cometido por servidor do INSS ou por terceiro não beneficiário que pratica a fraude, sendo consumado no momento do pagamento da primeira prestação do benefício indevido. Precedentes” (AgRg no REsp 1.347.082/RS, 5ª Turma, j. 21/08/2014).

“A Paciente não é segurada do INSS, mas funcionária do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de João Lisboa/MA, a quem se imputa a prática do delito de estelionato previdenciário. 2. Este Supremo Tribunal Federal assentou que o crime de estelionato previdenciário praticado por terceiro não beneficiário tem natureza de crime instantâneo de efeitos permanentes, e, por isso, o prazo prescricional começa a fluir da percepção da primeira parcela. Precedentes” (HC 112.095/MA, 2ª Turma, 16/10/2012).

Segue um esquema do que vimos:

ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO
PERMANENTE CONTINUADO INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES
O agente emprega a fraude contra a previdência e recebe mensalmente. O beneficiário morre e um terceiro continua recebendo os valores sem que a previdência perceba. O agente frauda a previdência para que terceiro se beneficia.
O termo inicial da prescrição ocorre com o último recebimento indevido da remuneração. O termo inicial da prescrição ocorre para cada parcela (cada delito isoladamente –Art. 119 do CP e STF – Súmula n. 497). O termo inicial da prescrição ocorre no recebimento da primeira parcela pelo “beneficiário”
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