Pluralidade de vítimas no latrocinio: crime único ou concurso formal?
Para começo de conversa, precisamos lembrar do conceito de latrocinio.
Na verdade, a expressão “latrocinio” não existe no Código Penal. Todavia, a descrição legal está prevista no artigo 157, parágrafo terceiro, segunda parte, do Codigo Penal.
Assim, diferentemente do que desforma em vários meios de comunicação, o latrocinio consiste em roubo com resultado morte (e não roubo seguido de morte).
Cumpre atentar que a morte pode ser dolosa ou culposa e assim qualificará o crime de roubo em razão do resultado agravador (a morte).
Agora, imagine o seguinte:
O agente adentra uma residência com o objetivo de subtrair objetos eletonicos. Ciente que há moradores no local, o agente entra armado e passa a ameaçar as vítimas, tudo para alcançar o seu objetivo: subtrair os computadores e aparelhos de TV .
Imagine que no meio da discussão, o agente acabe matando uma vítima para subtrair os bens. Neste cenário, estaremos diante do latrocinio, pois foi um roubo que resolutos morte.
Agora, imagine que no momento da subtração, o agente mate um casal, para conseguir a subtração de bens. Para atingir o patrimônio unico, duas vítimas são ceifadas. Estaremos diante de crime único ou formal?
Em razão da morte de duas vítimas, somos tentados a pensar que estaríamos diante de 02 (dois) latrocínios.
Contudo, a situação não passa de crime único. Isso porque, o patrimônio visado era singular e as mortes não faziam parte do dolo geral, mas apenas aconteceram para que o agente tivesse sucesso na empreitada criminosa.
Dai, pode-se pensar que estaríamos diante de uma proteção deficiente por parte do Direito Penal…
CALMA! A ocorrência de duas mortes no roubo não caracteriza concurso formal, mas não impede o tratamento mais severo na dosimetria da pena (artigo 59 do CP – primeira fase – consequências do crime).
Saliente-se que deve ser feito até em respeito a proporcionalidade, de forma a evitar que crimes de consequências diversas e em graus de gravidade diferenciada, tenham a mesma pena.
Este entendimento consta no Informativo n. 855 do Supremo Tribunal Federal. Confira:
No tocante ao reconhecimento de crime único, a Turma ponderou ser o latrocínio delito complexo, cuja unidade não se altera em razão da existência de mais de uma vítima fatal.
Acrescentou, por fim, que a pluralidade de vítimas é insuficiente para configurar o concurso de crimes, uma vez que, na espécie, o crime fim arquitetado foi o de roubo (CP, art. 157, § 3º), e não o de duplo latrocínio. Vencidos os ministros Roberto Barroso e Rosa Weber, que negavam provimento ao recurso, por entenderem que, diante da ocorrência de duas mortes, estaria configurado o concurso formal de crimes.
RHC 133575/PR, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 21.2.2017. (RHC-133575)
Como se vê, a pluralidade de vítimas no latrocinio consiste em crime único, uma vez que o roubo é crime contra patrimônio e a liberdade individual, sendo a morte apenas um resultado agravador que qualifica o crime. Por sua vez, a pluralidade de mortes, deve ser considerada na dosimetria da pena de forma mais severa, afastando qualquer proteção deficiente e efetividando a proporcionalidade.
OLHA SÓ!
O Superior Tribunal de Justiça, diferentemente do Supremo, entende que caso ocorram pluralidade de vítimas mortas e patrimônio único, estaremos diante do concurso formal e não crime único. Confira:
É pacífico na jurisprudência do STJ o entendimento de que há concurso formal impróprio no latrocínio quando ocorre uma única subtração e mais de um resultado morte, uma vez que se trata de delito complexo, cujos bens jurídicos tutelados são o patrimônio e a vida. STJ. 5ª Turma. HC 336.680/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 17/11/2015.
Prevalece, no STJ, o entendimento no sentido de que, nos delitos de latrocínio – crime complexo, cujos bens jurídicos protegidos são o patrimônio e a vida -, havendo uma subtração, porém mais de uma morte, resta configurada hipótese de concurso formal impróprio de crimes e não crime único. STJ. 6ª Turma. HC 185.101/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 07/04/2015