É crime deixar de pagar a “pensão alimentícia”?
Inicialmente, é necessário observar que existe um tipo penal sobre o tema. Trata-se do crime de abandono material, previsto no artigo 244 do Código Penal:
Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo:
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Parágrafo único – Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.
Superado o exame da disposição legal, é imperioso compreender que o simples inadimplemento da obrigação alimentar NÃO configura o crime. Isso porque, a doutrina considera que tal ilícito exige o dolo para sua configuração.
Além disso, cumpre notar que há também o elemento normativo do tipo, representado pela expressão “sem justa causa”. Decerto, caso o agente demonstre que não realizou o pagamento, por uma situação excepcional, a saber, por exemplo, doença grave ou impossibilidade absoluta de exercer atividades remunerada, o fato será atípico. Portanto, a expressão “sem justa causa” funciona como elemento negativo do tipo em comento.
O entendimento jurisprudencial é no mesmo sentido. O Superior Tribunal de Justiça exige que esteja comprovado o dolo de abandonar os filhos, ou seja, é necessário que o agente, mesmo possuindo condições de prover à subsistência dos filhos menores, deixe de fazê-lo, sem apresentar justificativa plausível para tanto. Confira:
PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL. ABANDONO MATERIAL. TRANCAMENTO. FALTA DE JUSTA CAUSA E INÉPCIA. ATIPICIDADE. AUSÊNCIA DE DOLO. 1. O habeas corpus, em regra, não se apresenta como via adequada ao trancamento da ação penal, por falta de justa causa, quando esta vem arrimada na falta de dolo. 2. Contudo, casos há, como o presente, no qual a acusação se mostra inidônea, de plano, ante a não demonstração de elemento do tipo e da flagrante inépcia, pelo deficiente descrição dos fatos. 3. Não basta, para o delito do art. 244 do Código Penal, dizer que o não pagamento de pensão o foi sem justa causa, se não demonstrado isso com elementos concretos dos autos, pois, do contrário, toda e qualquer inadimplência alimentícia será crime e não é essa a intenção da Lei Penal. 4. Ordem concedida para trancar a ação penal. ( HC 141069 / RS nº 2009/0130280-3 Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – Órgão Julgador SEXTA TURMA – Data do Julgamento 22/08/2011 – Data da Publicação/Fonte DJe 21/03/2012).
Como se vê, para que o inadimplemento da obrigação alimentar seja considerado crime é imperioso que seja demonstrado que o agente tenha agido com dolo, ou seja, com vontade livre e egoística de deixar de prover a subsistência de seus dependentes.
Caso contrário, a questão será resolvida na esfera cível, pois o mero inadimplemento de prestação alimentícia, por si só, não caracteriza o delito de abandono material.
Acho que faltou a palavra “não” nesse passagem: ” Superado o exame da disposição legal, é imperioso compreender que o simples inadimplemento da obrigação alimentar configura o crime”. Não seria: Superado o exame da disposição legal, é imperioso compreender que o simples inadimplemento da obrigação alimentar não configura o crime. abs
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