É possível a realização de acordo para exonerar o devedor dos alimentos em atraso?
Os alimentos são irrenunciáveis, nos termos do artigo 1707 do Código Civil: “Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.”
Para começo de conversa, lembremos que a irrenunciabilidade está adstrita aos alimentos firmados nas relações familistas: “O art. 1.707 do Código Civil não impede que seja reconhecida válida e eficaz a renúncia manifestada por ocasião do divórcio (direto ou indireto) ou da dissolução da ‘união estável’. A irrenunciabilidade do direito a alimentos somente é admitida enquanto subsista vínculo de Direito de Família” (Enunciado n. 263 do Conselho da Justiça Federal).
Sobre o tema, dentre tantos, registra-se “A cláusula de renúncia a alimentos, constante em acordo de separação devidamente homologado, é válida e eficaz, não permitindo ao ex-cônjuge que renunciou, a pretensão de ser pensionado ou voltar a pleitear o encargo. Deve ser reconhecida a carência da ação, por ilegitimidade ativa do ex-cônjuge para postular em juízo o que anteriormente renunciara expressamente” (STJ, REsp 701.902/SP).
Assim, é possível a renúncia dos alimentos por parte do cônjuge nas relações familiares.
Ocorre que, mesmo no Direito das Famílias, a irrenunciabilidade está relacionada aos alimentos presentes e futuros. Decerto, os alimentos pretéritos podem ser renunciados até mesmo via acordo (sobretudo quando já perderam o caráter alimentar).
Observe-se que o próprio artigo 1.707 do Código Civil permite que o credor não exerça o direito de cobrança. Logo, a irrenunciabilidade guarda relação com o direito, não com o exercício.
Na doutrina, Maria Berenice Dias afirma que “o credor não pode renunciar ao direito de pleitear alimentos. Mas, em sede de cobrança, a transação perdoando ou reduzindo débitos pretéritos pode ser homologado judicialmente.” (Alimentos: direito, ação, eficácia e execução. 2. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, págs. 38-39).
Recentemente, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, reconheceu a possiblidade de acordo para exoneração dos débitos alimentares vencidos e não pagos – REsp 1.529.532-DF, julgado em 09/06/2020, Informativo n. 673).
A possibilidade da exoneração dos débitos estimula à autonomia das partes para a realização de acordo, de autocomposição, como instrumento para se alcançar o equilíbrio e a manutenção dos vínculos afetivos.
Portanto, SE LIGA! A irrenunciabilidade relaciona-se aos alimentos presentes e futuros, não aos alimentos pretéritos.